Perdemos Kubrick

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um dos maiores diretores do século XX

No final da semana passada (março de 1999), morreu o diretor de cinema Stanley Kubrick. Seu nome esteve sempre associado ao novo e o melhor cinema que chegava às telas de tempos em tempos. Ele foi como um Spielberg mais sofisticado e menos preocupado em atender às exigências do mercado. Não fazia cinema para o público. Kubrick criava e educava espectadores do cinema. Transitou por diferentes temas de filmes, imprimindo sua marca em cada um deles. No começo da carreira, dois filmes se destacam: O Grande Golpe e Glória Feita de Sangue. O primeiro costuma aparecer esporadicamente na TV e mostra como, já em 1950, o diretor sabia tudo sobre como dar ritmo a um filme de ação. Seu estilo, como seria comum dali para frente, seria copiado repetidamente. Em Glória Feita de Sangue, Kubrick mostra com competência o jogo de interesses dentro de uma guerra. A estes filmes se seguiu uma série de sucessos que sempre causam surpresa aos desatentos quando descobrem que aquilo também foi Kubrick. Spartacus (1960) é um épico recheado com vários momentos antológicos de filmes de aventura. Em Lolita (1962), recentemente e desrespeitosamente refilmado, Kubrick descreve uma sexualidade contida que, com a sutileza certa, tornou o filme exemplo de sugestões eróticas no cinema. Em 1964, o diretor coloca um alucinado Peter Selers sentado numa ogiva nuclear dando início ao fim do mundo. Sem dúvida, se tivéssemos que escolher um diretor para mostrar, com sua obra, do que o cinema é capaz, ele seria Stanley Kubrick.

Foi em 1968, entretanto, quando o Brasil afundava na repressão política e o mundo ainda vivia à sombra do poder atômico de EUA e Rússia, que Kubrick foi buscar em Arthur C. Clark a ambiciosa história sintética do bicho homem em 2001 Uma Odisséia no Espaço. O filme, que muitos não sabiam se haviam entendido, foi “sentido” por todos. Ali estava a grandiosidade humana e uma visão triste de seu futuro. O seguinte foi Laranja Mecânica, um tratado sobre a violência e sua estilização. No Brasil, a censura vetou o aparecimento de rápidos nus frontais no filme. Kubrick supervisionou pessoalmente a colocação de ridículas bolinhas pretas que acompanhavam e escondiam os pelos pubianos das mulheres nas cenas proibidas. Aquelas imagens deveriam ser mantidas eternamente no filme como registro da mediocridade dessa época brasileira. Depois disso ainda tivemos três Kubricks: Barry Lindon, Iluminado e Nascido Para Matar. Todos eles bons filmes, entretanto, todos sofrendo pela responsabilidade de serem comparados à Laranja Mecânica e 2001.

Perdemos Kubrick. Ele sai de cena já nos créditos finais desse século. Suas imagens nos marcam pelo que acertaram e erraram na antecipação do final do século XX. Os russos altivos do filme 2001 acabaram em uma nação dominada pela máfia. Sua estação orbital Mir é um caso de lixo espacial ambulante. A violência da gangue de Laranja Mecânica está nas ruas dos subúrbios de todo o mundo. A eterna rebeldia de Spartacus parece massacrada por uma pasteurização do homem neoliberal da entrada do novo século. As máquinas estão mais amigáveis do que o computador Hal da nave Discovery. Porém, temos um bug do milênio para nos pregar um susto no final do ano. O mundinho está soturno como era a visão do diretor. Só nos resta pegar um cineminha para relaxar. Que tal um Kubrick?

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