o olhar da criança palestina

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Me lembrarei daquela imagem por muito tempo. Assistia na CNN uma reportagem sobre o ataque de Israel à faixa de Gaza. A imagem de um menino palestino chegando ao hospital era arrepiante. Tinha oito ou dez anos de idade. Ele não parecia ferido. Havia sangue em suas roupas. Ele se sentou numa cadeira, aparentemente de uma sala de emergência de hospital, e ficou ali parado olhando para a câmera. O menino não se mexia. Apenas olhava. O cinegrafista fez a tomada do alto, forçando o menino a olhar para cima e criando um efeito de reforçar sua fragilidade. Ali estava a criança minúscula, olhando um mundo que explodia regularmente a sua volta nos últimos dias. Seus olhos estavam arregalados, espelhando o medo e a incompreensão do que via. Seu olhar retratava o inferno a sua volta. As vezes o terror insinuado é mais enfático que as imagens ao vivo de bombardeios cirúrgicos. Este era um caso assim. Difícil esquecer aquela cena.

Compreender, ninguém compreende. Como uma situação pode chegar ao ponto de um país com irrefutável supremacia militar executar uma ação em que bombardeios aéreos e invasão por terra provocam destruição generalizada e a morte, até agora, de mais de 700 pessoas (no final beirou 1.500), boa parte delas, civis? O motivo é repetido pelos representantes do governo de Israel como uma oração monotônica: o Hamas tem que parar de lançar mísseis sobre Israel!

O grupo Hamas prega a aniquilação do Estado de Israel. Além de proclamar esta intenção, executa ataques rotineiros à Israel através de mísseis lançados no território israelense. Estes mísseis causaram a morte de 4 pessoas em Israel. Dizendo assim, parece que o Hamas são uns ensandecidos suicidas. Nem tanto. As coisas naquela área não são simples. O Estado de Israel foi criado em área cheia de palestinos dentro. Israel já ocupou áreas e deslocou palestinos de suas casas. Alguns falam de “limpeza étnica” realizada por Israel. O assunto não cheira bem.

Voltando aos mísseis lançados ultimamente pelos palestinos, a retaliação de Israel supera um pouco a regra do olho por olho. Está na base de mais de cem olhos palestinos para cada olho israelense atingido. Mas a matemática não se aplica a este caso. Regras de proporção são pouco práticas para uma situação de guerra. Israel quer deixar claro que não deixará ser agredida em seu próprio território sem revidar. A ação de Israel se enquadra como tentativa de dar exemplo radical para que o Hamas interrompa suas ações. Se com estas ações for possível “interromper” a existência do Hamas, melhor. Infelizmente, o resultado não deve ser esse. A comunidade internacional já entendeu o recado violento executado pelos israelenses. O Hamas também deve ter entendido. Fica a dúvida se este tipo de recado é bem compreendido e se é eficiente? A reação dos palestinos será de medo e resignação ou será de indignação e desejo de vingança. Eu não sei não. O jornal de hoje traz a notícia do pai que perante o cadáver do filho afirma que: “Agora, eu sou Hamas.”

Certamente as ações de Israel transcendem a pura retaliação aos toscos mísseis lançados pelo Hamas. Israel está aproveitando o vazio de poder dos EUA (Bush ainda governa?) para agir com menos chances de ser questionada pelos EUA. Também estão próximas eleições em Israel e é hora de realizar alguma ação que registre a posição do atual governo. Os motivos são ignóbeis, se considerarmos o número de vidas que está em jogo. Mas vidas são importantes para jornalistas contabilizarem e seus leitores se impressionarem. Para os decisores, as vidas são apenas pedras no tabuleiro. Em tempo, para decisores dos dois lados. Dirigentes do Hamas sabem que põem em risco sua população e, mesmo assim, desafiam Israel que tem poder militar absolutamente maior. Por outro lado, os judeus sabem que vão matar inocentes, mas creditam esta perda como parte da contabilidade natural de uma guerra.

Sei não. Alguma coisa está fora da ordem. O olhar daquele menino vai voltar em meus pesadelos.

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